Era tempo de voltar à estrada. De regresso ao continente, decidimos deixar por uns dias a bela Croácia, conduzindo de Drvenik até Nova Sela, local onde cruzamos a fronteira. Antes de nos dirigirmos para Mostar, exploramos, num primeiro momento, as cascatas de Kravice, habitualmente descritas como o segredo natural mais bem guardado da Bósnia e Herzegovina.
Situadas num vale com uma vegetação algo densa, de figueiras e álamos, é preciso uma breve caminhada a pé até alcançar as bonitas quedas de água que se dividem por um anfiteatro semicircular natural que se prolonga por 120 metros, à medida que o rio Trebižat tomba a uma altura de cerca de 30 metros… Já não fosse suficientemente especial admirar toda aquela envolvência, é ainda possível dar um mergulho nas águas frias, a jeito de beliscão para garantir que o facto de ali estarmos é inequivocamente real… Com vários restaurantes nos terraços ribeirinhos, bem como áreas para piquenique e instalações de campismo, acabamos por ali desfrutar de um brunch improvisado.


Revigorados e ainda com vontade de avançar um pouco mais, resolvemos voltar ao carro e seguir em direção a Počitelj, uma aldeola histórica conhecida como a Cidade de Pedra, ou não fosse construída sobre elevações rochosas às margens do Rio Neretva. A primeira referência histórica à sua existência surge em 1444, num documento do rei Afonso V de Aragão, no qual Počitelj é descrita como uma cidade fortificada controlada pelo conde Stjepan Vukčič Kosača. Manteve-se ocupada por uma guarnição húngara às ordens do rei Matthias Corvinus entre 1463 e 1471, quando foi sitiada e conquistada pelos Otomanos, que a mantiveram até 1878, data em que o Império Austro-Húngaro anexou a Bósnia e Herzegovina. Com a integração no Império Otomano, que continuou a expandir-se, Počitelj perdeu importância estratégica. Talvez tenha sido isso que a transformou em uma espécie de museu ao ar livre, que assistiu a inúmeras guerras, destruições e reconstruções. Hoje é um espaço de serenidade, onde o silêncio impera, e a história se conta pelos seus recantos…
Saltando o X para a mochila, e esta para as costas, o passeio começou pela alta torre Gavrakapetan, da qual é possível apreciar toda a localidade, criando um quadro inesperadamente bonito. Todavia, a principal atração da pequena cidade é, contudo, a mesquita Hajji Alija, situada no centro histórico. Os danos causados pela guerra civil que aqui se travou em meados dos anos 90 não são imediatamente percetíveis, mas duram. Físicos e sociais, porque os combates esvaziaram Počitelj da sua população que tarda em voltar.
Enquanto o X brincava com pequenas pedras e o Viajante Ilustrador andava fugido a fotografar, contemplei a marcante herança muçulmana deste local, concedida pelos antigos banhos que se encontram junto à estrada e pelos minaretes das suas mesquitas. É sempre interessante e curioso encontrar o Islão na Europa…
Em verdade, este era apenas um primeiro contato com um país dividido entre etnias e cultos, habitado por povos que professam as três religiões predominantes: católicos, ortodoxos e muçulmanos. Em razão da diversidade religiosa ainda muito presente na Bósnia, ansiava pela chegada à nossa próxima paragem, Mostar, um exemplo do cruzamento de culturas, celebrando, maioritariamente, o islamismo e o cristianismo. Aqui os homens de fé em Alá e em Deus parecem ter encontrado uma paz tão desejada e demasiadas vezes falhada…

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Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso: Louvado seja Deus, Senhor do Universo, Clemente, o Misericordioso, Soberano do Dia do Juízo Só a Ti adoramos e só de Ti imploramos ajuda; Guia-nos à senda reta À senda dos que agraciaste, não à dos abominados, nem à dos extraviados
Alcorão |
Pai Nosso que estais nos Céus, Bíblia
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