No adeus à Guatemala recordei um caleidoscópio que há uns anos me calhou em sorte num bazar. Em retrospetiva, olhar para este país é como ver através daquele tubo mágico. Aqui faz-se arquitetura e arte ao som de uma dança arrojada e única de cores, aqui a identidade maia sobrevive à modernidade. Um dos costumes que mais me fascinou e que (tão bem!) preserva este sentido de ligação e respeito pelos antepassados é o da tecelagem artesanal. Com o método de tear de cintura, uma forma de afirmação cultural, cada comunidade chega a ter o seu próprio padrão! Se na minha terra se diz que são as boas cozinheiras a conquistar os futuros maridos, por aqui o amor é entrelaçado pela mestria e pela fé das melhores tecedeiras. Todavia nunca esqueçamos que, para uma vida auspiciosa, é sempre bom tratar convenientemente os deuses!
Durante a viagem conhecemos um Xamã, uma espécie de líder espiritual, que ajuda os homens e as mulheres a encontrarem o amor, a prosperidade e a saúde.
“Mas afinal o que faz um Xamã?”
Estabelece a conexão entre o Homem e a Natureza. Numa cerimónia de fogo a que assistimos, este homem invocava os deuses, e através de uma fogueira com resina e velas de diferentes cores, representativas dos quatro pontos cardeais e elementos, libertava as impurezas do espírito. Aos deuses oferecia-se alguma comida e muita bebida alcoólica destilada, ou não soubessem estes viver bem! Contou-nos o filho do Xamã, o pequeno Max, que para criar o ser humano os deuses tiveram de fazer várias tentativas, que percorreram distintas fases e matérias como o barro, a madeira e o milho. Mas tudo isto e muito mais está explicado no Popol Vuh, um importante documento de compreensão da cultura maia.
“Estamos a chegar a La Hachadura!”, exclama Che.
Papeladas, algumas questões e longos minutos de espera. Passamos a fronteira.
“Uma linha invisível entre dois países. Em El Salvador as cores tornaram-se mais frias.”
Afamado por ser um dos países mais violentos e perigosos do mundo, em agosto de 2015 apresentava uma média de 30 mortes por dia! Uma dura realidade para um povo que ainda cicatriza as feridas de uma sangrenta guerra civil de 12 anos e que vitimou milhares de pessoas.
No trajeto da Ruta de Las Flores descobrimos Juayúa. Uma cidade vibrante com uma forte herança colonial e que naquele mês de janeiro se encontrava especialmente repleta de gente… Algo ali se comemorava! Depois de um breve passeio de reconhecimento, paramos numa das barraquinhas daquilo que parecia ser uma festa de aldeia. Pedimos pupusas, um prato tipicamente salvadorenho que mais não é do que uma tortilha recheada com feijão vermelho cozido, queijo e/ou chicharrón (torresmo). Saciados da fome mas não da curiosidade, perguntámos a uma família sentada à nossa beira qual o motivo de tanta folia. O patriarca, filho da diáspora, explica que são as festas do Cristo Negro, de quem é devoto ou não tivesse vindo dos Estados Unidos para O celebrar.
Quisemos conhecer este Cristo Negro e contemplar a Sua imagem. Não pude deixar de pensar como num país com referência a Jesus Cristo, é tão difícil encontrar a paz, ou não se chamasse “o salvador”!